Está na hora de dormir!
O estabelecimento de uma rotina,
com horários regulares, é importante para a criança e fundamental para a
qualidade do sono
Assim como uma boa alimentação, o sono é
fundamental para a saúde, o bem-estar emocional e o desenvolvimento físico do
bebê e da criança. O sono com qualidade beneficia a aprendizagem, a memória e o
comportamento diurno. Como ele ocupa grande parte do tempo de uma criança, é de
suma importância que pais, professores e cuidadores compreendam o sono
infantil.
Quanto uma criança dorme?
A quantidade de horas de sono de
uma criança varia conforme a faixa etária, havendo grande variabilidade na
necessidade de sono. Até os 3 meses de vida, o bebê pode dormir de 12 a 18
horas, alternando entre sono e vigília ao longo da noite e do dia (período do
sono polifásico). Entre o terceiro e o sexto mês, o sono passa a se consolidar,
e o bebê começa a apresentar períodos mais longos de sono durante a noite,
variando de 11 horas e meia a 14 horas por noite, com três cochilos durante o
dia. Entre 6 e 12 meses, o bebê dorme cerca de 11 a 13 horas e meia à noite e
mantém dois cochilos durante o dia. Entre 1 e 3 anos, a criança dorme de 11 a
12 horas e meia por noite.
A necessidade de cochilar é mais
frequente em crianças com até 3 anos, embora os cochilos possam persistir entre
as mais velhas. Na faixa etária de 4 a 6 anos, as crianças dormem em média 10 a
11 horas e meia por noite. Algumas dormem durante horas seguidas à noite e
cochilam pouco durante o dia, enquanto outras dormem menos à noite e cochilam
mais longamente durante o dia.
Quão frequentes são as
dificuldades com o sono?
Entre os problemas de sono, as
queixas mais comuns são a dificuldade de adormecer e manter o sono. Resultados
de um estudo nacional conduzido por Pires, Vilela e Câmara (2012) no estado de
São Paulo apontam que uma parcela considerável de crianças pré-escolares
resiste a ir para a cama (56%), apresenta dificuldade para adormecer (30%),
fica agitada, nervosa ou com medo antes de adormecer (22%), desperta várias
vezes durante a noite (35%) e fica sonolenta durante o dia (35%).
O que pode causar tais problemas?
Dificuldades de sono geralmente
envolvem associações inapropriadas de sono e/ou problemas de estabelecimento de
limites para crianças pequenas (6 meses a 5 anos). As associações positivas de
início do sono são condições que devem estar presentes para ajudar a criança a
adormecer na hora de dormir e voltar a dormir após despertar. Essas associações
são aquelas que lhe permitem adormecer sem assistência de um adulto, tais como
chupar o dedo ou a chupeta, segurar um bicho de pelúcia ou paninho. A
associação negativa para o sono ocorre quando outra pessoa ou circunstância é
necessária para ajudá-la a adormecer, como ter de embalá-la ou dar voltas de
carro até ela dormir.
Comportamentos como resistir em
ir para a cama, chorar, fazer birra nos momentos antes de dormir, despertar
chorando e buscando o auxílio dos cuidadores costumam ser seguidos de atenção e
colo dos adultos, que fortalecem esses comportamentos inadequados da criança. O
comportamento do cuidador é, portanto, uma questão fundamental na manutenção
desse quadro. Muitas vezes, o cuidador dá atenção à criança e a embala
justamente para cessar ou evitar o choro prolongado ou a birra que o incomodam.
Assim, a criança aprende rapidamente a atrasar o momento de dormir fazendo
várias solicitações de atenção, o que pode perpetuar tais problemas.
Sono e comportamento
Os problemas com sono na infância
podem causar prejuízos às crianças e aos seus familiares. Pesquisadores apontam
que a má qualidade de sono na infância prejudica a funcionalidade diurna e
afeta aspectos cognitivos, comportamentais e emocionais da criança. Um estudo
brasileiro (Rafihi-Ferreira et al., submetido a publicação) investigou a
ocorrência de problemas de sono em 83 crianças pré-escolares (2 a 5 anos) e
suas relações com problemas de comportamento. Os resultados apontaram que a má
qualidade de sono favorece a ocorrência de comportamentos externalizantes e
internalizantes.
Os comportamentos externalizantes
são aqueles voltados para o ambiente externo, como, por exemplo, quebrar regras
e ser agressivo, enquanto os comportamentos internalizantes são voltados para
si mesmo, como isolamento, queixas somáticas e ansiedade/depressão.
Considerando as possíveis repercussões que as dificuldades com o sono na
infância podem acarretar aos comportamentos diurnos, é de extrema importância a
identificação do problema.
Como identificar que a criança
está tendo problemas de sono?
Crianças que dormem mal podem
apresentar cansaço durante o dia, demonstrado por atitudes como bocejar,
choramingar, chorar, querer colo e atenção. A sonolência em crianças também
pode ser manifestada por meio de agitação, pouca disposição para brincadeiras
ou atividades, baixa concentração, irritabilidade, desatenção, agressividade e
instabilidade no humor. Ao perceber esses sinais, os professores devem
comunicar os familiares ou o psicólogo da creche ou escola a fim de que a
criança passe por uma avaliação mais cautelosa para identificação do problema.
Atividades durante o dia podem
ajudar a criança a dormir melhor à noite?
Ter uma rotina é fundamental para
um sono de boa qualidade. Ao falarmos de rotinas, referimo-nos tanto àquelas
que ocorrem à noite, no momento de dormir, quanto àquelas que acontecem durante
o dia, tais como horários das refeições, higiene, atividades escolares
brincadeiras e para dormir e acordar. Como a criança passa grande parte do
tempo na escola ou na creche, é importante que nesse espaço haja sempre uma
rotina consistente. Na idade pré-escolar, são comuns os cochilos durante o dia,
por isso os cuidadores devem estar atentos às rotinas pré-sono.
O estabelecimento de uma rotina,
com horários regulares para adormecer e acordar, é essencial e reconfortante
para a criança. Além disso, auxilia na qualidade do sono, contribuindo
positivamente para o bem-estar da criança e ajudando-a a entender que logo mais
virá o momento de dormir. Deve haver a compreensão de que o estabelecimento de
limites consistentes ajuda a criança a dormir independentemente. Fatores como
ambiente, horário e atividades prévias ao sono são essenciais para um sono de
boa qualidade.
Para um ambiente adequado,
deve-se manter uma temperatura agradável no local de dormir e reduzir o nível
de luz e ruído. A rotina deve ter um horário estabelecido para iniciar e para
acabar, com duração de mais ou menos 30 minutos, incluindo atividades
relaxantes. Nesse momento, o cuidador pode preparar atividades calmas, como
contar histórias e cantigas de ninar.
Para que a criança tenha
associações positivas de início de sono, convém ir para a cama ou o colchão
sonolenta, mas ainda acordada, e adormecer independentemente, sem ajuda de um
adulto. A rotina deve ser divertida, calma e agradável, por isso use o bom
humor para fazer desse horário uma experiência positiva e relaxante tanto para
você quanto para as crianças.
Edwiges Ferreira de Mattos Silvares é
professora titular do Instituto de Psicologia
da Universidade de São Paulo (USP). efdmsilv@usp.br
Renatha El Rafihi-Ferreira é
psicóloga e mestre em Análise do Comportamento. rerafihi@usp.br
Maria Laura Nogueira Pires é
psicóloga, doutora em Ciências e professora da Universidade Estadual Júlio de
Mesquita Filho (Unesp), campus de Assis.
Fonte : site da Revista Pátio, Educação Infantil